Publicidade

A Matriarca no Seio da Empresa Familiar – Por Aletéia Lopes

Especialista em Gestão de empresa familiar herdeiros
Especialista em Gestão de empresa familiar herdeiros

*Coluna Aletéia Lopes, 27/12/2021

A matriarca é a mediadora natural da família empresária. Ela é geralmente, a pessoa que busca apaziguar as situações de conflito que possam existir no seio da empresa familiar.

No entanto, ela tende a colocar panos quentes nos problemas, fazendo o possível para evitar discussões e brigas entre os filhos e o pai ou entre os filhos como irmãos, porque isso é “desgastante” e “doloroso” para ela. Porém, quando ela tenta evitar problemas apenas escondendo a sujeira debaixo do tapete, acaba contribuindo para que o problema cresça.

Não se pode negar que a matriarca tem uma motivação justa ao querer fazer isso, mas ao mesmo tempo, também agrava o problema no futuro, porque ela não está resolvendo o mesmo e sim apenas evitando de tratá-lo.

A questão é que o problema já existe, está instalado e contaminando a família e a empresa.

No início dos negócios, a maioria das matriarcas tendem a ajudar os maridos na empresa. Geralmente são muito requisitadas para fazer a tesouraria, o financeiro. Por quê? Na cabeça do fundador, como ele está na operação do negócio, precisa colocar alguém de confiança para fazer isso. É aí que entra sua esposa, assumindo um papel importante no início dos negócios da família. Não deixando de mencionar que o inverso acontece quando é a mulher que inicia o negócio, geralmente ela chama o marido para a área financeira por confiar muito nele. Porém, à medida que a prole cresce, ela, a matriarca, sente a necessidade de gradualmente se afastar dos negócios para cuidar dos filhos e o marido apoia totalmente essa decisão. Enquanto isso, a empresa começa a criar mais fôlego financeiro para contratar alguém de mercado que possa substitui-la definitivamente nessa função estratégica.

Em alguns casos, elas apenas diminuem o ritmo de trabalho, mas não saem totalmente do negócio. Colocam outra pessoa para fazer a parte operacional na empresa, mas visitam o negócio duas vezes por semana para fazer um tipo de “auditoria”. Por isso, muitas vezes ela fica com um pé dentro e um pé fora da empresa, e só sai totalmente do negócio quando os filhos crescem e entram.

Mesmo ela não estando mais no dia a dia da empresa, que chega a um momento em que cresce exponencialmente, ela ainda consegue ter uma noção de como as coisas funcionam e justamente por ela ter essa noção é que seu sofrimento como matriarca é maior. “Melhor seria que não soubesse de nada”, pensa algumas. Muitas vezes a ignorância nos liberta do sofrimento.

Como ela já esteve lá, sabe como o marido costuma atuar, se é teimoso ou passivo, se é rígido ou flexível demais, se é desconfiado ou confia demais nas pessoas, se tem preferência por um filho em comparação a outro, se às vezes é rude ou se tem um funcionário antigo de confiança para o alimentar de “informações”.

Mas enquanto esse é o olhar dela, o olhar do filho já não é assim, porque muitas vezes se choca com a forma de como o pai usa da sua autoridade e considera a abordagem do fundador desnecessária e aí começam os conflitos e o sofrimento. Pai e filho começam a se bater dentro do negócio e os dois trazem isso para essa mãe, cada um com suas dores, geradas pelos seus respectivos pontos de vista da situação, enquanto ela também sofre e tenta apaziguar as brigas e desentendimentos entre eles, se tornando muitas vezes uma confidente sobrecarregada pelas duas partes.

Então, por exemplo, o filho chega em casa, procura a mãe e diz a ela:

– Não sei mais o que eu faço com o papai. Ele é muito grosseiro, quer tudo só do jeito dele, não quer ouvir as minhas sugestões ou quando alerto sobre alguma situação, prefere ouvir aquele funcionário intocável dele.

Enquanto isso, o fundador chega em casa, procura a esposa e diz:

– Não sei mais o que faço com o nosso filho. Vou ter que demiti-lo, porque ele não quer fazer as coisas direito. É muito irresponsável e não escuta ninguém.

Então, ela fica absorvendo as dores de pai e filho, enquanto se torna advogada de defesa de ambos os lados.

A questão é que ela fica em um fogo cruzado, porque recebe as informações de ambos os lados e não quer optar por defender apenas uma parte. Assim começa o sofrimento dela e, por isso, tenta colocar panos quentes sobre a situação. Porém, como foi dito no início, ignorar o problema não o resolve, apenas o agrava, junto aos desalinhamentos, à falta de regras, tudo isso continua a causar transtornos. Por não ter essa independência afetiva e emocional, ela não consegue mediar a situação de fato e de forma imparcial. Por isso acaba não sendo realmente ouvida nem pelo marido e nem pelo filho.

Quando ela percebe que não consegue mediar a situação, passa a buscar ajuda através de um trabalho de Governança Familiar.

Não tenho dúvidas que essa matriarca, muito mais do que uma especialista em Governança Familiar, tem um forte desejo de resolver esses conflitos, porque eles envolvem pessoas por quem ela tem muito amor, carinho, afeto. Porém, o que há de diferente na chegada de uma mediadora profissional é a solução com conhecimento técnico, a referência de sucesso com outras famílias, e principalmente a independência emocional. Pois em certas situações, a mediadora precisa ser firme, assertiva e imparcial.

Porém, para alguém que tem uma ligação afetiva com as partes envolvidas no conflito, geralmente é muito difícil ter essa firmeza. No caso da matriarca, ela teme que, se for dura com o marido, ele vai ficar chateado com ela. Por outro lado, ela também teme que se for rude com o filho, ele possa se afastar, não compartilhar mais sobre seus sentimentos e não a procurar mais. Ela quer dar pelo menos o afago e o colo.

No entanto, as matriarcas são uma peça decisiva na execução do trabalho de Governança Familiar, porque mesmo sofrendo caladas, elas trazem um importante ponto de vista da situação conflituosa instalada no seio da empresa familiar. E, não é por falta de vontade, e nem muito menos por falta de amor que a matriarca falha em mediar um conflito entre o fundador e os herdeiros, mas justamente por essa forte ligação afetiva que têm com ambas as partes, dificultando assim, a construção de um melhor acordo familiar através da definição de um Protocolo Familiar que possa trazer harmonia para a família e longevidade para os negócios.

*Aletéia Lopes é escritora e diretora da HerdArs com experiência em projetos de governança para Famílias Empresárias e formação de Herdeiros/Sucessores. Mentora estratégica de executivos familiares e mediadora de conflitos. Graduada em Serviço Social, com formação em Mentoring, Coaching, Constelação Sistêmica e Terapia Familiar. Membro do Instituto Brasileiro de Governança corporativa – IBGC/Ce. Diretora de Governança da Câmara de Comércio e Indústria Brasil e Alemanha no Ceará – CCIBAC.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do ENB.

M Dias Brancoconteúdo patrocinado