Em um dos mais significativos escândalos corporativos do Brasil, a varejista Americanas finalmente admitiu a existência de “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões em seus balanços. Esse assunto veio à tona há cinco meses, quando a empresa anunciou o problema em um comunicado importante ao mercado.
As demonstrações financeiras da Americanas vinham sendo manipuladas pela diretoria anterior, incluindo o ex-presidente-executivo, Miguel Gutierrez, juntamente com outros ex-diretores e executivos seniores, de acordo com um comunicado ao mercado divulgado na terça-feira (13). Esta foi a primeira vez que a empresa admitiu tal informação, a qual faz parte de um relatório apresentado por assessores jurídicos ao conselho de administração da empresa.
Atualmente, a Americanas está passando por um processo de recuperação judicial após descobrir o déficit contábil no início do ano. A empresa declarou que o impacto dos ajustes decorrentes das fraudes nos resultados da companhia ao longo do tempo ainda está sendo investigado. No entanto, “a expectativa da administração é de que o impacto nos resultados mais recentes seja significativo”, destacou a nota.
O relatório, entregue ao conselho de administração da empresa na segunda-feira (12), foi fundamentado em documentos entregues pelo comitê de investigação independente e documentos adicionais identificados pela administração e seus consultores após reuniões com o comitê. O relatório também aponta a participação na fraude do ex-presidente-executivo Miguel Gutierrez, que deixou a empresa em dezembro de 2022, bem como outros ex-diretores e executivos seniores.
Acionistas proibidos de vender ações
Os acionistas de referência da varejista Americanas, Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira, deram um passo importante em direção a um acordo com os bancos credores. A empresa encontra-se em recuperação judicial desde janeiro, com dívidas declaradas de R$ 43 bilhões.
De acordo com informações publicadas pela agência Bloomberg, os principais acionistas concordaram em ficar impedidos de vender ações da empresa por um período de três anos. Esse período, conhecido como “lock-up” no mercado de capitais, é comumente utilizado em IPOs (ofertas públicas iniciais de ações) como forma de proteger acionistas minoritários e garantir que indivíduos com acesso a informações privilegiadas não obtenham vantagens em relação aos demais.
Embora o lock-up já tenha sido aceito pelo trio de bilionários, o período exato ainda está em discussão, segundo fontes próximas aos credores.
No caso específico da Americanas, em que os principais bancos possuem cerca de R$ 24 bilhões a receber, parte das dívidas será convertida em ações da varejista. Dessa forma, o lock-up assegura que os acionistas bilionários não abandonarão a empresa em dificuldades nas mãos dos novos sócios.
Atualmente, as ações da Americanas valem pouco mais de R$ 1. Antes do escândalo do rombo contábil ser revelado em 11 de janeiro, cada ação valia R$ 12.
Como parte das negociações com os credores, o trio de bilionários se comprometeu a injetar R$ 12 bilhões. Agora, os credores também estão exigindo o período de lock-up para evitar o esvaziamento do negócio por parte dos ex-controladores.
Para que o plano de recuperação judicial da Americanas, apresentado no final de março, seja homologado pela Justiça, é necessário chegar a um acordo com os bancos. As instituições financeiras não têm dúvidas de que houve fraude contábil para inflar os balanços da varejista e, consequentemente, o valor das ações da empresa. Isso beneficiou diretamente acionistas e diretores cuja remuneração variável estava ligada às ações, uma prática comum em empresas administradas pelo trio de bilionários, como Ambev e RBI (proprietária do Burger King).
Em nota, a Americanas afirmou que está comprometida em construir um consenso sobre o Plano de Recuperação Judicial com seus credores, ressaltando que o plano está sujeito a revisões e ajustes. A empresa busca um plano que reflita visões compartilhadas e atenda às necessidades de seus stakeholders.