Nosso entrevistado da semana é o novo gestor máximo da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), Danilo Cabral. Conversamos sobre os principais desafios no comando da instituição para devolver à Sudene o protagonismo que ela teve em outros momentos de sua história, afirmando que a encontrou esvaziada ao assumir o cargo no último mês. Cabral é formado em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), com especializações em Direito Administrativo e Administração Pública. Serviu como auditor concursado do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE/PE), foi deputado federal por três mandatos e vereador do Recife.
A Sudene é uma autarquia especial vinculada ao Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional. Sua função é promover o crescimento inclusivo e sustentável de sua área de atuação e a integração competitiva da base produtiva regional na economia nacional e internacional.
Confira entrevista exclusiva ao jornal Economic News Brasil:
O senhor tomou posse recentemente. Quais os planos para sua gestão?
A prioridade é reposicionar a Sudene no debate do planejamento estratégico da região, de modo que ela possa cumprir o seu papel de ser uma articuladora, mobilizadora e integradora das políticas de desenvolvimento regional. Nós temos hoje uma nova oportunidade de promover um reencontro do Brasil com o Nordeste. A eleição do presidente Lula simboliza isso, e a Sudene deve cumprir esse papel para que possamos fazer, como ocorreu no primeiro mandato do presidente Lula, o Nordeste crescer mais do que o Brasil.
Quais os principais desafios encontrados?
O principal desafio é, primeiro, de natureza política. Precisamos devolver à Sudene o protagonismo que ela teve em outros momentos de sua história. Sobretudo nos últimos quatro anos, durante a relação tensionada que tivemos com o governo Bolsonaro no Nordeste, vimos a Sudene ser esvaziada. Isso levou ao surgimento do Consórcio dos Governadores do Nordeste como uma instância de discussão das questões centrais da nossa região. Então, estamos neste momento reconectando a Sudene com todos os atores importantes para a redução das desigualdades regionais.
Queremos abrir a instituição para a sociedade, estabelecendo um amplo processo de diálogo e, a partir disso, unir esforços junto com o governo Lula e o ministro da Integração, Waldez Góes, para devolver esse protagonismo político à instituição.
O que pretende com o diálogo com o Consórcio Nordeste e os governadores da região?
O Consórcio Nordeste se consolidou como um ente de governança regional a partir, justamente, do esvaziamento do papel da Sudene, estimulado pela relação tensionada do governo Bolsonaro com a região. Isso ocorreu justamente por não dialogar com os governadores. Na verdade, o que a gente viu foi uma relação de intensa agressão ao Nordeste e aos estados pelo governo Bolsonaro.
O consórcio, naturalmente, surgiu como um espaço de diálogo dos governadores para discutir as questões da região e buscar soluções. A primeira agenda que eu fiz como superintendente da Sudene foi justamente procurar o governador da Paraíba, João Azevedo, que coordena o Consórcio do Nordeste, para que a gente pudesse trazer de volta os governadores para o Conselho Deliberativo da Sudene, que sempre foi, no processo histórico, o espaço de diálogo das questões da região.
Queremos reconectar não só os governadores, mas também os prefeitos, o setor produtivo, a academia e os trabalhadores, para que a Sudene possa fazer, a partir da sua mobilização, o seu papel de integradora da região.
Quais as expectativas para o Plano de Desenvolvimento Regional do Nordeste (PRDNE) e o que ele prevê?
O Conselho Deliberativo da Sudene (Condel) aprovou, em sua última reunião, o PRDNE. Essa foi a primeira reunião com presença física efetiva dos governadores desde 2019. O plano, a ser enviado ao Congresso Nacional com o Plano Plurianual (PPA), orientará as políticas na região até 2027, estabelecendo uma visão de futuro próspera, justa e inovadora para o Nordeste, valorizando sua diversidade e promovendo a dignidade do povo.
O projeto foi formado através de diálogo com todos os estados, aprovando um conjunto de diretrizes, valores, princípios e projetos, com governadores apresentando prioridades. Ele foca no crescimento no Nordeste, estimulando a desconcentração e interiorização do desenvolvimento. Esse movimento começou no governo Lula, com a expansão de indústrias, universidades e obras importantes.
O objetivo é potencializar o desenvolvimento em 52 regiões denominadas cidades-polo, que estão crescendo rapidamente, sendo um impulso para a expansão de toda a região. A estratégia também inclui induzir o crescimento para o interior do Nordeste, dando continuidade a um processo iniciado anteriormente.
Como a participação da Ferrovia Transnordestina no Plano pode favorecer a economia do Nordeste?
A Transposição do Rio São Francisco e a Transnordestina são obras estratégicas para a região Nordeste do Brasil. A primeira está em estágio avançado, levando água para 12 milhões de nordestinos no semiárido; faltam apenas obras complementares. A Transnordestina, composta por trechos que ligam o Piauí ao Porto de Pecém, no Ceará, e de Salgueiro ao Porto de Suape, em Pernambuco, também está avançada e é crucial para a integração regional. Essa obra vai possibilitar uma estrutura logística de descentralização e distribuição do que é produzido pela economia nordestina. A conclusão dos trechos, tanto para o Porto de Pecém quanto para o Porto de Suape, é uma determinação do governo do presidente Lula e do ministro Waldez Góes, reforçando a importância do projeto.
O fundo de compensação será suficiente para ressarcir os Estados dos prejuízos com o fim dos incentivos fiscais?
Os incentivos fiscais foram cruciais para o desenvolvimento do Nordeste, atraindo R$ 300 bilhões em investimentos nos últimos 10 anos e gerando mais de 1 milhão de empregos. A renúncia fiscal permitiu a chegada de empresas, mas com o fim desses incentivos, o Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR) deverá compensar possíveis perdas na transição. A reforma tributária aprovada na Câmara simplifica impostos e desonera a cesta básica, mas é crucial preservar critérios justos para a distribuição do FDR no Senado, como o PIB invertido, favorecendo estados com menor índice proporcional. Essa questão, omitida na Câmara, precisa ser corrigida, e ajustes são necessários no Conselho Federativo, que resolverá dúvidas sobre o novo sistema. A influência dos estados mais populosos pode prejudicar o Nordeste, e essa preocupação deve ser abordada no Senado.
Quais setores são mais beneficiados pela Sudene?
A Sudene, junto ao Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional e os bancos, especialmente o Banco Nordeste, administra políticas de incentivos e fundos regionais. Esses estímulos beneficiam diversos setores da economia, como indústria, agropecuária e turismo, gerando empregos. Investimentos expressivos estão sendo feitos em infraestrutura, com destaque para o estímulo à produção de energia limpa e renovável. O Nordeste é responsável por 83% de toda energia limpa produzida no país, tornando-se um importante indutor do desenvolvimento regional.
Quais incentivos a Sudene oferece para novos empreendimentos?
A Sudene utiliza três principais instrumentos para promover o desenvolvimento regional no Nordeste. O primeiro, o Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE), é uma linha de crédito exclusiva que pode financiar até 80% do investimento com taxas competitivas. O segundo é o Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE), administrado em parceria com o Banco do Nordeste, oferecendo uma das melhores opções de financiamento com juros abaixo do mercado. Por fim, há os incentivos fiscais, que podem reduzir o imposto de renda de pessoas jurídicas em até 75%, se reinvestidos, em projetos de instalação, modernização, ampliação ou diversificação. Esses três instrumentos incentivam empresas a se instalarem na região, gerando oportunidades locais.
Quais fundos estão disponíveis para empresários no Nordeste e qual é o orçamento total?
São os dois fundos mencionados anteriormente, o FDNE e o FNE, que é o Fundo Constitucional. Ao todo, nós estamos falando aqui de algo em torno de R$ 40 bilhões que, anualmente, está à disposição da Sudene para que, com esse instrumento e seguindo os critérios que estão colocados no PRDNE, a gente possa fazer a atração de empreendimentos para a nossa região.
Como os planos mencionados pretendem impactar o setor industrial do Nordeste?
No Ceará, o impacto no setor de energia limpa é evidente. De 2018 a 2023, foram investidos R$ 45 bilhões do FNE em empresas de energia solar e eólica, com planos para investimento em hidrogênio verde. Além disso, R$ 3,5 bilhões do FDNE foram investidos na Transnordestina. Esses exemplos ilustram de maneira objetiva a importância dos fundos na transformação da região.