Nesta quarta-feira (17), o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central manteve a taxa Selic em 15% ao ano, maior nível em quase 20 anos. A decisão já era esperada, mas reforça a diferença em relação ao cenário internacional. No mesmo dia, o Federal Reserve (Fed), banco central dos Estados Unidos, reduziu os juros em 0,25 ponto percentual, para a faixa entre 4% e 4,25% ao ano. Foi o primeiro corte em nove meses. O contraste levanta a pergunta: por que a Selic não caiu no Brasil, mesmo com cortes em outras economias?
Inflação e política fiscal travam cortes da taxa Selic
A resposta está na inflação ainda alta. Apesar de alimentos e bens industriais mostrarem queda recente, os serviços seguem caros. Esse é um dos pontos que mais preocupa o Banco Central. O mercado de trabalho também continua aquecido. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) mostra geração de empregos e renda em expansão, o que sustenta a demanda e mantém preços pressionados.
Além disso, a política fiscal do governo continua expansionista. O aumento de gastos previsto para 2025 e 2026 preocupa investidores, que já questionam a capacidade do país em cumprir metas fiscais. Esse desequilíbrio reforça a leitura de que não há espaço para cortes antecipados.
Impacto direto para empresas e famílias
O empresário sente o peso da taxa Selic hoje em cada decisão de negócio. Investimentos que dependem de financiamento ficam mais caros, linhas de crédito encurtam e projetos de expansão são adiados. Pequenas e médias empresas, que recorrem ao capital de giro, enfrentam custos sufocantes.
O consumidor também é atingido. O crédito imobiliário, o financiamento de veículos e até o parcelamento de compras ficam mais restritos. Quem já está endividado encontra dificuldade para rolar dívidas. O resultado é um círculo de consumo mais fraco e empresas com dificuldade para aumentar vendas. Essa trava explica por que a economia cresce menos, mesmo quando a Bolsa registra recordes.
Pedro Brandão: disciplina e paciência
O especialista em finanças Pedro Brandão analisa que a decisão mostra disciplina monetária. “O corte do Fed é um sinal de estímulo, mas o Brasil vive uma situação diferente. A inflação continua desancorada, o risco fiscal preocupa e o mercado de trabalho sustenta a demanda. Reduzir a taxa Selic agora colocaria em dúvida a credibilidade do Banco Central”, afirma.
Segundo Brandão, a paciência é essencial. “O Copom prefere errar pela cautela do que permitir que os preços voltem a acelerar. A Selic em 15% é dura, mas protege o país de um novo ciclo inflacionário. Para empresários e consumidores, isso significa esperar mais antes de ver juros mais baixos”, completa.
Geldo Machado: o custo da taxa Selic para o crédito
Para Geldo Machado, presidente do Sindicato das Sociedades de Fomento Mercantil (SINFAC CE.PI.MA.RN), os efeitos já são sentidos no dia a dia. “No crédito privado, esse nível de 15% trava operações. Empresas de menor porte sentem imediatamente, porque têm menos alternativas. Muitos negócios adiam investimentos e repensam planos de expansão. É um impacto direto no crescimento”, avalia.
Apesar das críticas, Machado reconhece a necessidade da medida. “O custo é alto, mas o risco de cortar antes da hora seria pior. Poderíamos ver inflação em alta novamente e um câmbio mais instável. O recado do Copom é firme: primeiro é preciso estabilidade, depois virão os cortes”, acrescenta.
Assista também: A comentarista de economia da CNN, Rita Mundim, analisou a decisão do Copom e destacou os impactos da taxa Selic mantida em 15% para a economia brasileira.
O efeito do Fed no câmbio e nos preços
A decisão norte-americana pode beneficiar o Brasil. O corte do Fed tende a enfraquecer o dólar no mercado global e valorizar o real. Essa dinâmica já apareceu nesta quarta-feira: o Ibovespa subiu 1,06%, aos 145.592 pontos, marcando recorde histórico, enquanto o dólar ficou praticamente estável, cotado a R$ 5,3012.
Pedro Brandão lembra que isso pode ajudar a inflação brasileira. “Um dólar mais fraco reduz o custo de importados e ajuda a controlar preços de bens comercializáveis. Isso cria um cenário mais favorável para o Banco Central brasileiro no futuro. Mas ainda não é suficiente para justificar um corte imediato da Selic”, diz o especialista.
Projeções de Brandão: cortes na Selic só em 2026
Na visão de Brandão, o futuro da taxa Selic depende da política fiscal. “Se houver disciplina nas contas públicas, o espaço para cortes só deve se abrir em 2026. O mercado já trabalha com a possibilidade de a Selic começar a cair apenas a partir da primeira reunião de janeiro de 2026, em trajetória lenta e condicionada à inflação”, projeta.
Ele reforça que não há espaço para cortes em 2025. “O Copom deixou claro que a taxa vai permanecer nesse nível por um período prolongado. O investidor e o empresário precisam ajustar expectativas. Essa é a mensagem: cautela agora, alívio só depois”, conclui.
Projeções de Machado: impacto prolongado no crédito
Geldo Machado acrescenta que o custo da Selic alta continuará sendo pesado para empresas, mas enxerga alívio no médio prazo.
“As estimativas de mercado indicam que, ao final de 2026, a Selic pode chegar a algo entre 12% e 13%. Mesmo assim, a trajetória será gradual e depende de disciplina fiscal. Até lá, empresas precisarão conviver com crédito caro e consumidores enfrentarão restrições de financiamento.”, afirmou o ex-banqueiro.
Desfecho: paciência e estratégia para corte na taxa Selic
A decisão do Copom de manter a taxa Selic em 15% reflete o dilema brasileiro. De um lado, há pressão internacional por cortes, com bancos centrais flexibilizando políticas. De outro, persistem riscos internos que impedem o Brasil de seguir o mesmo caminho.
Para empresários, o recado é preparar estratégias de curto prazo em um ambiente de crédito caro, enquanto aguardam condições melhores. Para consumidores, o alerta é redobrar atenção ao endividamento, já que o custo do dinheiro continuará alto.
Como destacam os especialistas ouvidos pelo Economic News Brasil, a Selic deve permanecer em 15% durante todo 2025, com cortes graduais apenas a partir de 2026. Até lá, disciplina monetária, paciência e planejamento serão as palavras de ordem para empresários e consumidores que precisam navegar em um cenário de juros elevados.