O leitor que acompanha a economia brasileira precisa entender o peso da decisão tomada pelo Comitê de Política Monetária (Copom). Ao manter a Selic em 15% e sinalizar juros altos por longo prazo, o Banco Central (BC) envia uma mensagem clara: prefere sacrificar parte do crescimento para assegurar a convergência da inflação. A ata divulgada na terça-feira (23/09) reconhece a moderação da atividade, mas sustenta que a cautela é necessária diante de um cenário global incerto. Na prática, isso se traduz em crédito caro, consumo contido e investimentos adiados.
Juros altos por longo prazo e o crédito estrangulado
Os efeitos já são visíveis no dia a dia da economia. Famílias enfrentam endividamento e financiamentos mais caros, e empresas adiam projetos diante do custo elevado do capital. O BC admite que os estímulos fiscais e linhas de crédito lançados até agora não alteraram o ritmo lento da atividade. Analistas do mercado financeiro avaliam que, ao insistir em juros altos por longo prazo, a autoridade monetária impõe um custo expressivo aos setores mais dependentes de financiamento, como construção civil e varejo. A resistência do consumo se mantém, mas apoiada apenas na massa salarial elevada, um fôlego que tende a se esgotar.
Contradição entre discurso e projeções de inflação
A ata do Copom adota um tom mais brando, mas os números revelam que a convergência da inflação à meta ainda está distante. As projeções oficiais indicam:
- 2025: IPCA em 4,8%, acima da meta de 3% definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), mesmo com intervalo de tolerância entre 1,5% e 4,5%.
- 2026: inflação projetada em 3,6%, mais próxima do centro da meta.
- 2027: IPCA em 3,4%, já dentro da margem desejada.
Segundo analistas, manter juros altos por longo prazo com inflação ainda acima do alvo reforça a crítica de que o custo da política pode ser desproporcional ao benefício esperado. Em termos práticos, o remédio corre o risco de ser mais forte que a doença.
Contexto global e riscos internos com juros altos por longo prazo
O documento também ressalta fatores externos, como as tarifas impostas pelos Estados Unidos e a incerteza sobre os juros do Federal Reserve. O risco, segundo Geldo Machado, presidente do Sinfac (CE, PI, MA e RN), é que o Banco Central, ao olhar demais para o cenário externo, “subestime os efeitos internos da desaceleração”.
Para Machado, “a insistência em juros altos tende a prolongar a fragilidade de setores produtivos e gerar custos sociais elevados, como aumento do desemprego e retração do crédito produtivo”.
Avaliação geral: o custo de prolongar o aperto
Economistas ouvidos pelo Economic News Brasil consideram que a decisão do Copom marca um ponto de inflexão. O Banco Central demonstra disposição em manter juros elevados até 2026, mesmo com sinais claros de enfraquecimento doméstico. O dilema é evidente: de um lado, a inflação só converge plenamente para a meta em 2027; de outro, os juros altos por longo prazo drenam dinamismo da economia, travam investimentos e aumentam incertezas.
Em linguagem de mercado, trata-se de um “custo de carregamento” alto demais para um retorno modesto. A leitura final é que a estratégia do Copom privilegia a ortodoxia monetária em detrimento do crescimento, criando um ambiente em que o Brasil pode até atingir a meta de inflação, mas à custa de uma economia estagnada.