O Congresso Nacional concluiu nesta sexta-feira (20/12/2024) a aprovação do pacote de corte de gastos do governo federal. A rapidez na aprovação (conjunto de propostas foi apresentado há 3 semanas) veio com a desidratação das medidas, que já não eram consideradas suficientes pelo mercado, o que coloca em risco a capacidade do governo de promover ajuste fiscal. Economistas afirmam que o ministro Fernando Haddad precisará enfrentar novas batalhas para controlar as despesas obrigatórias.
Governo nega desidratação do ajuste fiscal
O governo nega que as medidas tenham sido desidratadas, mas especialistas avaliam que as mudanças são significativas. O pacote, inicialmente planejado para gerar uma economia de R$ 71,9 bilhões em dois anos, não reduz o gasto total da União, mas ajuda a evitar uma piora fiscal rápida.
Durante a tramitação do ajuste fiscal, os parlamentares blindaram emendas obrigatórias, afrouxaram o combate aos supersalários e excluíram mudanças no BPC e no repasse ao FCDF (Fundo Constitucional do Distrito Federal). Além disso, restringiram a flexibilização dos recursos ao Fundeb. Para garantir apoio, o governo precisou intensificar articulações e oferecer emendas extras.
O economista Manoel Pires destaca à Folha de SP que, embora a aprovação rápida do ajuste fiscal tenha sido notável, ela diluiu o impacto do pacote. Mudanças no BPC e no Fundeb podem reduzir os ganhos fiscais, e o pacote já insuficiente terá novos capítulos.
A economista Thaís Zara aponta que o mercado permanece apreensivo com a trajetória das contas públicas, já que o governo ainda depende de receitas para alcançar superávits. Apesar das críticas, Haddad e Padilha negaram que o pacote de ajuste fiscal tenha sido desidratado.
Enfraquecimento de Haddad
Assim que deu início à sua gestão no Ministério da Fazenda, Fernando Haddad gozou de certa confiança do mercado, a despeito de pertencer ao PT, partido que tem feito críticas ao ex-prefeito de São Paulo. Logo no primeiro ano de governo, agentes financeiros reconheceram o empenho do ministro na elaboração e aprovação do arcabouço fiscal, sinalizando que faria os ajustes necessários.
Porém, no ano de 2024, a desconfiança cresceu sobre a capacidade de o governo cortar gasto, mas não apenas querer fazer o ajuste fiscal sob a ótica do aumento da arrecadação. Some a isso as declarações de Lula contra a taxa de juros do Banco Central e divergências dentro do próprio governo, o que piorou a visão do mercado sobre o compromisso com o ajuste fiscal. A alta histórica do dólar foi um sintoma da incerteza do mercado.
Veja itens desidratados no pacote de Haddad
Emendas parlamentares: A Câmara aprovou o bloqueio de apenas parte das emendas para cumprir os limites do arcabouço fiscal, contrariando a proposta de ajuste fiscal original do governo, que previa o bloqueio total.
BPC (Benefício de Prestação Continuada): O relator excluiu mudanças que restringiam o acúmulo de benefícios, ampliavam o conceito de família no cálculo da renda e endureciam critérios para concessão. Também foi retirada a alteração no critério de deficiência. Apesar disso, a Câmara manteve trechos que condicionam o benefício à avaliação de deficiência moderada ou grave. No Senado, o governo se comprometeu a vetar esses pontos devido à resistência.
FCDF (Fundo Constitucional do Distrito Federal): Caiu a proposta de permitir à União reduzir os repasses futuros ao fundo, o que geraria economia de R$ 2,3 bilhões em dois anos, dentro dos R$ 71,9 bilhões previstos pelo pacote.
Supersalários: A regulamentação passou de lei complementar, como previa o governo, para lei ordinária, que exige quórum menor. Essa alteração permite que o tema seja ajustado por resoluções do CNJ (Conselho Nacional de Justiça).
Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica): A proposta do governo de reduzir para 20% a complementação da União ao fundo, economizando R$ 10,3 bilhões até 2026, foi revista pelo relator. O percentual caiu para 10%, válido apenas em 2025.
Orçamento: Foi eliminada a revogação da obrigação de executar programas previstos no Orçamento, mantendo a impossibilidade de a equipe econômica realizar contingenciamentos ou ajustes preventivos para atingir a meta fiscal.
Fundos públicos: A Câmara autorizou a desvinculação de recursos de cinco fundos públicos para o abatimento de dívidas do governo. A proposta original previa a inclusão de oito fundos.
Créditos tributários: O governo perdeu a possibilidade de limitar o uso de créditos tributários para abater impostos em caso de déficit nas contas públicas a partir de 2025.