A crise financeira da Ambipar ficou evidente após a companhia recorrer à Justiça do Rio de Janeiro para obter proteção contra credores, em decisão válida por 30 dias e prorrogável. A medida, que funcionou como barreira imediata contra execuções, foi interpretada como etapa preparatória para recuperação judicial.
A Ambipar atua em diversos segmentos para oferecer serviços e produtos completos voltados à gestão ambiental e construiu relevância como multinacional brasileira do setor. O contraste entre sua expansão global e a atual crise chamou atenção do mercado. Nesta sexta-feira (26/09), as ações encerraram cotadas a R$ 8,85, acumulando queda de 20,20% nos últimos seis meses.
Crise da Ambipar e impacto no caixa
Em junho, a empresa reportava quase R$ 5 bilhões em disponibilidades. Desse total, R$ 2,6 bilhões estavam em caixa ou aplicações de resgate imediato e R$ 2,1 bilhões em um fundo de direitos creditórios (FIDC), com prazos de 30 a 60 dias. A baixa transparência sobre esse FIDC e a dispersão dos recursos em instituições fora do país acenderam dúvidas entre credores.
No mesmo período, a Ambipar registrou prejuízo de R$ 165,8 milhões no primeiro trimestre e de R$ 134,1 milhões no segundo. Com alavancagem de 2,56 vezes, analistas destacaram que a empresa poderia enfrentar cláusulas de vencimento cruzado (cross-default), que tornariam toda sua dívida, próxima de R$ 10 bilhões, exigível de uma só vez.
Crise da Ambipar e o contrato de swap
O gatilho para a crise ocorreu em 18/09, quando o então CFO João Arruda assinou um aditivo de R$ 3 bilhões em contrato de swap cambial com o Deutsche Bank. Esse tipo de operação costuma proteger empresas com dívidas em dólar, mas, nesse caso, as garantias foram atreladas ao desempenho dos próprios bonds da Ambipar, o que elevou o risco.
As chamadas de margem ultrapassaram R$ 200 milhões em poucos dias, drenando liquidez rapidamente. A situação provocou reação em cadeia: o Santander, credor de US$ 119 milhões com vencimento em 2027, exigiu pagamento antecipado de parte do valor e sinalizou que poderia acionar cláusulas contratuais mais rígidas. O risco de descontrole se espalhou para todo o passivo.
Ambipar e governança em xeque
A turbulência não ficou restrita às finanças. Em poucos dias, a empresa perdeu o CFO João Arruda, o diretor jurídico Mauro Nakamura e o diretor de relações com investidores Pedro Petersen. Essas saídas, somadas a questionamentos regulatórios, reforçaram a percepção de desorganização em um momento crítico.
A falta de clareza sobre a real disponibilidade do caixa também entrou no radar da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Parte dos recursos classificados como liquidez imediata não tinha informações suficientes sobre origem e lastro, o que acendeu alertas no mercado.
Estrutura de controle e papel do fundador
A crise financeira da Ambipar também expôs a figura de seu fundador e controlador. O empresário Tércio Borlenghi Jr. acumula os cargos de CEO e sócio majoritário, concentrando tanto a gestão executiva quanto o poder de decisão no conselho. Ele detém 48,17% das ações ordinárias, enquanto o Everest Fundo de Investimento em Participações possui 25,30%. Outros acionistas representam 26,45% do capital, e a tesouraria mantém apenas 0,07%.
Esse arranjo dá a Borlenghi controle de fato sobre a companhia, mesmo sem maioria absoluta, reduzindo espaço para contrapesos internos. Analistas destacam que a concentração de poder pode ter contribuído para a crise financeira da Ambipar, ao limitar independência na gestão e dificultar respostas rápidas à pressão dos credores.
Crise financeira da Ambipar e expansão acelerada
O modelo de crescimento agressivo também ajuda a entender a situação atual. Nos últimos anos, a Ambipar incorporou dezenas de empresas no Brasil e no exterior, formando uma estrutura muito pulverizada. A expansão ampliou a presença internacional, mas elevou a alavancagem e aumentou a dependência de instrumentos financeiros sofisticados.
O contrato de swap com o Deutsche Bank surgiu justamente nesse contexto de endividamento externo crescente. Fontes próximas afirmam que a falta de clareza sobre o destino de recursos captados e o papel do FIDC agravaram a percepção de risco que culminou na atual crise.
Alertas do mercado das agências de classificação
As agências Fitch e S&P colocaram a Ambipar em observação negativa. A Fitch destacou problemas de transparência, enquanto a S&P foi categórica: parte do caixa não tem liquidez de curto prazo e a rotatividade da diretoria expõe falhas de supervisão. Esses pontos reforçam que a crise financeira da Ambipar não é apenas momentânea, mas sinaliza problemas estruturais.
Onde está o dinheiro?
A crise financeira da Ambipar expõe um dilema central: a empresa afirma ter caixa robusto, mas não consegue transformá-lo em liquidez imediata. O contrato de swap, a pressão dos credores, a debandada de executivos e a expansão desordenada ampliaram as incertezas. Segundo analista ouvidos pelo Economic News Brasil, a resposta à pergunta “onde está o dinheiro da Ambipar?” pode determinar se a companhia renegociará dívidas e preservará operações ou se entrará no maior processo de recuperação judicial já visto no setor ambiental brasileiro.