*Coluna Aletéia Lopes, 20/12/2021
É muito comum a independência está ligada ao dinheiro, “agora sou independente, tenho meu próprio dinheiro”. No entanto, a realidade das famílias empresárias pode ser um pouco diferente dessa colocação, pois durante a implantação de projetos de Governança Familiar já ouvi de Herdeiros a seguinte frase: “Quero sair da escravidão!”. Tudo isso parece muito paradoxal, pois como um herdeiro que nasceu numa família empresária com bastante recurso financeiro pode se sentir escravo e sem independência financeira?
O problema é realmente complexo. De um lado, temos herdeiros que vivem uma vida de escravidão, presos a um trabalho que não escolheram, com uma retirada financeira que muitas vezes não cobre a despesa do estilo de vida que sempre tiveram na casa dos pais e sem condições de sair dessa situação por não ter experiência profissional que seja validada pelo mercado.
Um labirinto confuso, onde o sentimento de incapacidade, frustração e falta de liberdade tomam conta da saúde física e emocional do herdeiro. E a única saída as vezes, parece ser aumentar a dose do antidepressivo para conseguir ir em frente. Uma dor silenciosa que pode ser curada dentro da própria família empresária, quando a família entende que é possível construir acordos que possibilitem a tão sonhada carta de alforria.
De outro lado, temos herdeiros como Dom Pedro I que foi nomeado príncipe regente do Brasil por seu pai, tendo a oportunidade de seguir um caminho longe da família real, no entanto recebeu uma carta da Coroa Portuguesa exigindo seu imediato retorno para Portugal e que o fez dar o seu famoso grito as margens do Ipiranga “Independência ou morte!”. Será que esse grito não teria também relação com sua situação de herdeiro da corte ao ser pressionado a voltar para um lugar que talvez não se identificasse? Sabemos inclusive que a atitude de Dom Pedro I desagradou a corte Portuguesa a ponto de haver suspensão de seus rendimentos.
Essa história vivida por Dom Pedro I é mais comum do que imaginamos dentro das famílias empresárias, pois muitos herdeiros que tentam buscar seu próprio caminho as vezes são tolhidos por sua família que usam inclusive o poder financeiro, ameaçando retirar seus rendimentos e mesadas com o intuito de trazer o herdeiro de volta a empresa da família, como se o único caminho a seguir seria a sucessão. Alguns pais empresários se frustram quando escutam dos filhos que são infelizes dentro da empresa familiar e que querem uma ajuda para buscar sua felicidade com outro tipo de atividade. Eles falam: “Filho você é livre! Pode buscar sua felicidade, mas lembre-se você não terá mais seu pró-labore e nenhuma ajuda financeira!”, ou seja, que tipo de liberdade é essa?
Portanto, mesmo com tantos desafios enfrentados pelos paradoxos encontrados no cenário das empresas familiares é possível substituir a frase “Independência ou morte” pela frase “Independência e liberdade para escolher seu próprio caminho, é vida!” nas famílias empresárias.
*Aletéia é escritora e diretora da HerdArs com experiência em projetos de governança para Famílias Empresárias e formação de Herdeiros/Sucessores. Mentora estratégica de executivos familiares e mediadora de conflitos. Graduada em Serviço Social, com formação em Mentoring, Coaching, Constelação Sistêmica e Terapia Familiar. Membro do Instituto Brasileiro de Governança corporativa – IBGC/Ce. Diretora de Governança da Câmara de Comércio e Indústria Brasil e Alemanha no Ceará – CCIBAC.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do ENB.