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Terceira crise energética global: a crise se repete – Por Beatriz Canamary

Com os preços de gás natural e carvão em alta, o mundo enfrenta uma crise energética global, relembrando lições do passado. A transição para energias limpas parece distante, enquanto a dependência dos hidrocarbonetos cresce. O Golfo Pérsico é um ator crucial, e o carvão, o mais poluente, ainda desafia expectativas. Veja como essas forças moldam o futuro energético e o papel do Brasil nesse cenário.

Com os preços de gás natural e carvão atingindo recordes e os do petróleo bruto não muito abaixo do pico de 2008, o mundo parece estar mais dependente do que nunca no carbono. Esta situação reflete uma crise energética global que tem afetado diversos países.

Para muitos, os planos para a transição de energia limpa estão cada vez mais distantes.

No meio desta terceira crise energética global, o legado das duas primeiras – provocadas pela guerra árabe-israelense de 1973 e pela Revolução Iraniana de 1979 – deve ser relembrado.

Embora líderes do Oriente Médio defendam a tese de que o mundo emergiu da primeira crise do petróleo mais dependente dos hidrocarbonetos do que antes, dados evidenciam que tal narrativa é controversa. Essas crises geopolíticas dos anos 1900 certamente não resultaram no fim do petróleo, mas deram um golpe nunca recuperado.

Nos EUA, foram necessárias duas décadas para que o consumo de petróleo voltasse aos níveis de 18,5 milhões de barris diários atingidos em 1978, às vésperas da segunda crise do petróleo. Os países da União Europeia nunca voltaram aos seus níveis de demanda de 16,9 milhões de barris diários de 1979, apesar de uma economia quase três vezes maior que naquela época.

O petróleo, em 1973, compunha cerca de metade do consumo de energia primária do mundo. Agora somente 31%. A mudança, principalmente em relação aos membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), foi abrupta: entre 1973 e 1985, a participação da energia mundial derivada do petróleo da OPEP caiu de 25% para 11%. Nunca subiu substancialmente acima desses níveis.

Com medo de ter suas economias reféns de um grupo de monarquias absolutistas, os grandes consumidores de petróleo iniciaram uma transição energética distanciando-se dessa fonte de energia, o que parece ter sido bem-sucedida.

No Reino Unido, a economia iniciou a corrida pelo carvão à medida que novas usinas de energia eram construídas, minas de carvão reestruturadas e reservas abertas. No Mar do Norte, plataformas de petróleo offshore surgiram para aproveitar as próprias reservas de petróleo da Europa. Um aumento na demanda de combustíveis fosseis nos Estados Unidos causou um boom em suas reservas de carvão, que desde a década de 1980 fornece mais de 40% do carvão consumido pelo país.

A França anunciou planos para mudar toda a sua frota de geração para energia nuclear e tentou vender a tecnologia ao Irã e ao Iraque para garantir o fornecimento de petróleo. Em todo o mundo, a geração nuclear quintuplicou entre 1973 e 1983, antes de dobrar novamente em 1990.

No Brasil, o governo introduziu combustível rodoviário à base de etanol e construiu as barragens de Itaipu e Tucuruí, até hoje algumas das maiores do mundo.

A explicação para essa mudança está em uma das mais antigas lições dos mercados de commodities — a substituição.

Sempre que um produto se torna muito caro ou não confiável, os consumidores mudam para algo que atenda melhor às suas necessidades. A vantagem do petróleo em 1972 era seu baixo preço e pronta disponibilidade. Em 1980, era cerca de oito vezes mais caro e muito menos confiável. Tudo isso contribuindo para a crise energética global.

Os eventos recentes expõem uma dramática desaprendizagem dessa lição. Com a decisão do presidente Vladimir Putin de usar o gás como arma após a invasão da Ucrânia pela Rússia, é o gás que será o maior perdedor.

O consumo cairá este ano em cerca de 20 bilhões de metros cúbicos, segundo dados recentes da Agência Internacional de Energia (EIA, sigla em inglês), e o crescimento do consumo de médio prazo, previsto em 1,6% em 2019 e 1,4% no ano passado, será de apenas 0,8% até 2025, segundo a EIA.

O ciclo se repete: os preços recordes do gás natural e as interrupções no fornecimento ameaçam sua segurança como fonte de energia. A instabilidade atual afeta a confiança no gás natural como uma opção confiável e acessível para abastecimento energético.

O Petróleo e Gás do Golfo Pérsico

Entretanto, nesse momento, é a região do Golfo Pérsico que se encontra em sua plenitude energética. Nos próximos cinco anos, a economia global receberá cerca de US$ 3,5 trilhões, impulsionada por decisões de Putin. Isso pode transformar a Rússia em uma peça-chave na geopolítica mundial. Essa influência virá não apenas da reengenharia dos fluxos globais de energia, devido às sanções e mudanças climáticas, mas também da reconstrução de alianças no Oriente Médio. Esses fatores reforçam a posição da Rússia como um ator relevante nesse cenário.

Em resposta à expansão da influência do Irã ao norte na última década, a maioria dos estados do Golfo, Egito, Israel e outros se aproximaram. Isso se reflete no Abraham Accords (Acordos de Abraham) assinados por Israel e dois estados árabes em 2020, mediados pelos Estados Unidos, que buscam estabelecer relações diplomáticas na região.

Arábia Saudita e Emirados Árabes estão intensificando investimentos em petróleo, visando garantir sua posição futura no setor. Ao mesmo tempo, o Qatar amplia seus projetos de gás natural liquefeito (GNL), com previsão de alcançar uma produção anual equivalente a 33% do GNL comercializado globalmente em 2021. Essas iniciativas refletem a busca dos países por se manterem competitivos em um cenário energético global em constante transformação.

Uma resultante provável é que o Golfo Pérsico permanecerá importante nos assuntos mundiais nos próximos anos. Em petróleo e gás, sua participação nas importações da Europa pode aumentar de menos de 10% hoje para mais de 20%. Mas embora um novo Golfo possa estar surgindo, sua volatilidade política não pode ser ignorada.

O consumo de carvão

A crise dos hidrocarbonetos pode parecer uma vitória para o clima e a transição energética. No entanto, com a geopolítica dominando o debate, o carvão, o combustível fóssil mais poluente, está em alta. Embora o consumo de carvão dificilmente retorne ao pico de 2013, ele superou as previsões anteriores. O aumento do preço do gás natural levou concessionárias na Ásia e na Europa a adiar a transição energética, mantendo o uso de carvão por mais tempo do que o previsto.

Diferente de petróleo e gás, reservas de carvão são encontradas em uma diversidade de países com China, Índia e Indonésia respondendo por mais de dois terços da produção global. Com a crise energética em alta, há risco de o desligamento necessário das fontes geradoras de energia à carvão no mundo seja adiado.

Energias renováveis

Mesmo assim, as forças de substituição favorecem as energias renováveis, que agora são mais baratas em quase todas asregiões. Três quartos da nova capacidade de geração de energia da Índia instalada em 2021 era renovável; até agosto deste ano, o número equivalente foi de 93%. A geração a carvão na China cairá 1% este ano, o primeiro declínio desde 2015, segundo a EIA.

Em todos os lugares, as energias renováveis ​​e, em menor grau, as nucleares, representam a maior parte da nova demanda. As emissões do setor de energia devem cair 5% nas Américas e 8% na Europa no próximo ano, com a redução na demanda por carvão. O REPowerEU, plano lançado pela União Europeia em maio, busca reduzir a dependência do gás russo, ampliando a capacidade solar. No Mar do Norte, os governos europeus se comprometeram a construir 65 gigawatts de energia eólica offshore até 2030, aproximadamente 1,5 vez a capacidade offshore global de 2023. Essa iniciativa visa enfrentar as crises energéticas atuais, inspiradas nas lições da década de 1970.

A Lei de Redução da Inflação dos EUA, anunciada em julho, visa cortar as emissões do país em 40% até 2030, tomando como referência os níveis de 2005. A indústria de painéis solares, por exemplo, já trabalha na construção de uma cadeia de suprimentos robusta. Isso ajudará a colocar o setor no caminho para alcançar zero emissões de carbono, contribuindo significativamente para a meta ambiental. A estratégia reforça o compromisso dos EUA com a sustentabilidade e incentiva o crescimento da energia limpa.

As tentativas de provar a dependência mundial dos combustíveis fósseis apenas aceleraram nosso distanciamento deles. A transição energética está cada vez ganhando mais força. E o Brasil está claramente bem posicionado nesse contexto da crise energética global, com todos os seus investimentos e projetos em geração de energia através de fontes renováveis para curto, médio e longo prazos.

*Opinião – Artigo Por Beatriz Canamary.

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