O regramento do registro de uma marca empresarial, seja ela de negócio ou de produto, é regido pela Lei de Propriedade Industrial. De certo que, a Lei 9.2796/96 traz em seu corpo de normas a Convenção da União de Paris, que foi o primeiro acordo internacional que trata sobre a propriedade industrial, sendo assinado na capital francesa no ano de 1883.
Neste momento, o Supremo Tribunal Federal (STF) está com a pauta em votação sobre a titularidade da marca que encampa o nome “Iphone”, onde a depender do resultado final pode mudar tudo o que já se julgou até o momento sobre a aplicação do princípio da prioridade no registro de marca em solo brasileiro.
O princípio da prioridade é uma das colunas da Lei de Propriedade Industrial, no que pese ao registro de marca. Defende esse postulado axiológico, aquele que primeiro fizer o depósito do pedido do registro da sua marca tem a precedência em detrimento das demais solicitações retardatárias. O próprio Supremo já decidiu outros casos, onde ficou vencedora a tese do respeito à prioridade do titular do pedido do registro perante o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). Todavia, o voto do ministro Luiz Fux encampou a aplicação da tese do fenômeno de mercado conhecido por secondary meaning ao case do julgamento da marca “Iphone”, tendo como partes a Gradiente e a Apple.
O secondary meaning é uma tese muito utilizada pelos tribunais de justiça dos Estados Unidos e da Europa, e que serviu de fundamentação para o julgado do case no STJ mediante a interpretação com base no direito comparado. De acordo com essa vertente interpretativa afeita aos direitos de propriedade industrial, quando uma marca fraca é depositada ou recém registrada perante a autoridade pública de registro de marca e com o passar do tempo esse mesmo signo (marca) adquire notoriedade e importância, fica escanteado a relevância do requisito da prioridade na proteção do registro marcária.
A batalha que ora está sendo travada no STF pela titularidade da marca “Iphone” teve o entendimento pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) que fixou a nulidade parcial do registro da marca “G Gradiente Iphone”. Aqui, o que ficou vedado para a empresa Gradiente foi tão somente a sua utilização da expressão “Iphone” de forma isolada e exclusiva. Até o momento, essa questão na Corte constitucional já conta com quatro dos onze votos, com o empate dado pelos ministros Dias Toffoli, relator da ação no STF, e Gilmar Medes a favor da Gradiente. De modo contrário, o ministro Luiz Fux e Luís Roberto Barroso sustentam sua leitura jurídica em prol da estadunidense Apple.
Interessante frisar que nos dois votos antagônicos, o ministro Barroso enfatiza que “não ofende a Constituição a proibição do uso isolado de termo que constitua elemento de marca registrada, tendo em vista a sua vinculação mundialmente consagrada a produto fabricado por concorrente”. Já o ministro Luiz Fux ao trazer para o julgado o fenômeno mercadológico do secondary meaning (significação secundária da marca), atribui um efeito de notoriedade para uma marca inicialmente considerada como “marca fraca” ao tempo do seu depósito do pedido do registro junto à autarquia federal competente. O supremista Fux declara que “obedecer a prioridade da Gradiente”, como propõe o Ministro-Relator, pode ocasionar um verdadeiro comprometimento das razões que originalmente fundamentaram o próprio sentido da propriedade intelectual, cujo aparente antagonismo com o princípio da livre concorrência decorre de uma visão estática e errônea sobre os mecanismos de funcionamento de um mercado competitivo”.
No olhar sobre este case da marca “Iphone” no palco do STF, imperioso destacar que a Lei de Propriedade Industrial defende o direito à prioridade ao tempo do depósito do pedido do registro no sistema do INPI. Quebrar esse entendimento, sob o pálio de que em razão do crescimento da marca da Apple nos últimos anos traz um risco para a segurança jurídica, avalio.. A interpretação da norma jurídica interna do País deve respeitar a legalidade, a letra da lei, em mesmo adotando-se uma interpretação extensiva ou logíco-sistemática. No mais, sendo que autorizar a atuação da marca Apple, com o seu registro no INPI, no mesmo nicho de mercado da Gradiente violaria o princípio da especialidade.
O que a Apple busca é uso do elemento nominativo “Iphone” em seus produtos mediante o registro da sua marca no INPI e na mesma classe da marca “G Gradiente Iphone”, podendo assim fazer concorrência direta no mesmo segmento de produtos da Gradiente. De certo que a expressão “Iphone” tem origem na aglutinação da letra I de “internet” com a palavra “phone” (telefone).
O interessante é que ao consultar o sistema de busca de registro de marcas do INPI é possível identificar as marcas registradas “REIPHONE Assistência” e “EPIPHONE” na mesma classe em que está registrada a marca “G Gradiente Iphone”, sendo que possuem objetos de atuações diferentes entre si e não colidindo com a marca da Gradiente já registrada. Desta forma, não há como o consumidor fazer confusão ou associação.
No caso, o próprio INPI já concluiu que somente o nome “PHONE” é considerado uma marca fraca, não podendo ser utilizada de forma exclusiva, e sempre com a ressalva de não causar confusão ou associação ao consumidor que busca adquirir um produto específico contendo o elemento nominativo “Iphone” em sua marca.
O que está em jogo agora no colo dos ministros do STF é a validade ou não da tradição jurisprudencial da própria Corte constitucional até o momento, acerca do reconhecimento do princípio da prioridade no processo de registro de sinal marcário e na forma entabulada pela Lei de Propriedade Industrial (LPI).
Se de um lado, o voto do ministro relator sagrar-se vencedor e a favor do impedimento do registro da marca “Iphone” pela Apple na classe de registro já concedido pelo INPI para a Gradiente, estará sendo reforçado o respeito ao princípio da prioridade em par com o reconhecimento da segurança jurídica para uma economia capitalista e de livre mercado. No entanto, caso seja decretada a nulidade parcial da marca registrada “G Gradiente Iphone, inaugura-se na Lei de Propriedade Industrial uma nova fase interpretativa do requisito da prioridade em registro de marcas. Um risco de grandes proporções para a economia, concluo.
Esclarece apontar que a decisão do STF seja para qual lado for, não ensejará automaticamente no impedimento do uso da marca Iphone em produtos da Apple, cobrança de indenização por utilização de marca não registrada ou identificação de caducidade, ou perca da marca registrada “G Gradiente Iphone” por falta de utilização. Todas essas indagações deverão ser processadas no juízo competente, que não é o STF. Neste julgamento aqui, trata-se, portanto, da constitucionalidade do registro da marca “G Gradiente Iphone” e não das consequências por suposta violação da lei de propriedade industrial pela gigante Apple.
Inobstante à evolução jurídica dos julgados, sendo inclusive oportuna para uma sociedade em efetivo desenvolvimento, reduzir a segurança jurídica de uma lei nacional consubstanciada no sucesso mundial da marca “Iphone” da Apple será o pleno reconhecimento expresso de fendas em nosso sistema jurídico quanto à matéria específica.
*Opinião – Artigo Por Frederico Cortez – Sócio Cortez & Gonçalves Advogados Associados e CEO na MyMarca- Propriedade Industrial & Intelectual
*O texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal.









