A presença crescente das big techs no mercado financeiro brasileiro tem chamado atenção de reguladores e analistas. Gigantes da tecnologia e do varejo eletrônico (por isso o nome “big tech”), plataformas como Mercado Livre, Magazine Luiza e Amazon ampliaram serviços de pagamento e crédito, competindo diretamente com bancos e fintechs tradicionais.
Essa convergência entre varejo digital e serviços financeiros, embora traga inovação, também desperta preocupações sobre concentração de poder, interoperabilidade e uso de dados de milhões de consumidores.
A entrada de big techs no mercado financeiro e a nova fronteira das finanças digitais
A exemplo disso, o Mercado Pago, braço financeiro do Mercado Livre, é o caso mais consolidado de integração de uma big tech no mercado financeiro. Autorizado pelo Banco Central (BC) como instituição de pagamento, o serviço opera conta digital, oferece crédito para consumidores e vendedores e permite aplicação em títulos públicos. Em 2024, a controladora reportou carteira de crédito total de US$ 6,6 bilhões na América Latina, alta de 74% ano a ano, segundo comunicado a investidores e materiais de resultados.
Além disso, outras big techs seguem o mesmo caminho no mercado financeiro. O MagaluPay, lançado pelo Magazine Luiza em 2020, permite transferências via Pix, emissão de cartão e pagamento de compras no marketplace. Já a Amazon começou a testar soluções de crédito para vendedores brasileiros, com intermediação de instituições financeiras locais, um modelo semelhante ao adotado nos Estados Unidos e no México.
Crescimento das carteiras digitais e crédito próprio
Essas plataformas ampliaram o acesso a serviços financeiros para públicos historicamente desbancarizados. Apesar disso, a estratégia também reforça o poder de mercado das big techs que concentram dados de consumo, histórico de compras e comportamento digital.
Entre as principais características desse avanço estão:
- Integração total com marketplaces, permitindo crédito direto a sellers e consumidores.
- Ampliação do escopo de dados usados para definir limites e taxas de juros.
- Convergência entre logística, varejo e serviços financeiros, gerando ecossistemas fechados.
Para o Cade, que monitora eventuais efeitos concorrenciais, essas práticas exigem atenção especial quando há uso cruzado de dados entre diferentes segmentos do mesmo grupo econômico. Isso pode gerar vantagem indevida frente a bancos e fintechs menores. Um dos maiores conflitos com a crescente expansão de big techs no mercado financeiro.
Desafio regulatório e risco de concentração de poder de big techs no mercado financeiro
O Banco Central tem buscado equilibrar abertura à inovação com estabilidade do sistema financeiro. A autarquia já exige que empresas de pagamento mantenham contas segregadas e adotem padrões de segurança e interoperabilidade semelhantes aos bancos. Ao mesmo tempo, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) acompanha o impacto do compartilhamento de informações em ambiente digital. Especialmente após a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) entrar em vigor em 2020.
Casos recentes analisados pelo Cade de big techs no mercado financeiro, como parcerias entre plataformas e instituições financeiras, demonstram a preocupação com práticas de autopreferência (priorização de serviços próprios) e efeitos de rede que podem restringir a competição. Ainda não há fusões bloqueadas no Brasil nesse contexto, mas o tema é prioridade nas agendas de regulação prudencial e concorrencial.
O equilíbrio entre inovação e regulação financeira
A expansão das big techs no mercado financeiro redefine as fronteiras entre tecnologia, consumo e crédito. O Brasil, por sua estrutura regulatória avançada — com Pix, Open Finance e supervisão integrada —, se tornou um laboratório global para esse tipo de convergência. No entanto, especialistas alertam que a concentração de dados e o controle das plataformas sobre canais de venda e crédito exigem transparência algorítmica e governança de dados.
Nesse cenário, o desafio dos próximos anos será garantir que a inovação financeira beneficie consumidores e pequenos negócios. Isso sem comprometer a concorrência ou a proteção de informações pessoais. O equilíbrio entre crescimento digital e regulação sólida tende a definir o ritmo de transformação do sistema financeiro brasileiro.