*Coluna por Marcos Hirano, 31/05/2022
Nossos ancestrais mais primitivos no planeta, há centenas de milhares de anos, desenvolveram meios para caçar, coletar alimentos, produzir artefatos para facilitar seu dia a dia, dominaram o fogo, que os possibilitou tirar maior proveito dos nutrientes, acelerando seu desenvolvimento, como já vimos em Estamos vivenciando a era do caos?.
Ciência, segundo o dicionário Oxford Languages é “corpo de conhecimentos sistematizados adquiridos via observação, identificação, pesquisa e explicação de determinadas categorias de fenômenos e fatos, e formulados metódica e racionalmente”. Esses conhecimentos empíricos são agrupados, compreendidos, estruturados, organizados e explicados em conhecimentos teóricos sobre os eventos da natureza. A base da ciência é, portanto, a experiência, a base do método científico. No extremo oposto está o negacionismo.
Artes
Arte é uma forma de expressão de sentimentos, angústias, experiências, pontos de vistas.
A fotografia por exemplo, é um tipo de arte que se popularizou muito pelo advento da fotografia digital, massificando o ato de fotografar, fazendo com que possamos ser surpreendidos a qualquer momento, com uma câmera registrando cada passo dado. Apesar disso, a arte da fotografia também envolve observação, identificação, pesquisa e perseverança para o registro desejado. E para que uma boa fotografia seja conseguida, também é preciso aplicação de método, técnicas e por muitas vezes, paciência. Mas justamente pela popularização, em tese qualquer pessoa pode produzir registros fotográficos bastante interessantes, alguns mais experimentais, outros mais alinhados com os conceitos e fundamentos da fotografia clássica.
Por meio do olhar do fotógrafo, é possível observar um recorte, daquilo que ficou registrado no quadro, conforme as escolhas que a pessoa que fotografou fez. Por trás das escolhas realizadas pela pessoa fotógrafa até chegar ao clique derradeiro, muita coisa pode estar envolvida.
E como eu costumo dizer para Cleo, minha filha de 10 anos, cada escolha é (no mínimo) uma renúncia. Isto é, para que aquelas informações do fotograma terem sido escolhidas, tantas outras tiveram necessariamente que ficar de fora.
Dilema da ciência e dos cientistas
Cientistas são reducionistas por natureza, por necessidade. Cientistas precisam tornar objetos de estudos complexos, com inúmeras variáveis, em problemas mais simples, mensuráveis e correlacionáveis. Para tal, decompõem-nos até que sejam pequenos o suficiente para que possam dissecá-los e analisá-los. As análises científicas por sua vez, precisam adotar premissas generalistas, desprezando em geral, variáveis locais, em nome da universalidade. Isto é, precisam fazer escolhas, reduzindo a variabilidade do espectro de análise para ter um foco mais estrito, tendo que naturalmente deixar outras tantas variáveis de fora.
Ciência cidadã
Os tempos atuais, como temos abordado nesta coluna, demandam cada vez mais que as questões sejam analisadas dentro do contexto em que ocorrem. As abordagens de design têm procurado colocar sempre o humano no centro. As questões a serem solucionadas precisam envolver os atores que as vivenciam, para que possam compartilhar dores, expectativas, demandas, desejos.
Isso quer dizer que abordagens científicas não são adequadas para a solução de problemas? Claro que não! O fato é que as abordagens científicas também precisam se adaptar, para que se tornem mais inclusivas, uma ciência cidadã, uma Ciência por Amor!
Nas palavras do Professor Antonio Lafuente, do Departamento de História da Ciência do Conselho Superior de Investigações Científicas – CSIC¹, “Ciência por amor é um convite para refletir sobre o que a ciência deve aos cidadãos e não tanto sobre o que a sociedade deve à ciência”.
O Profº Lafuente faz algumas distinções organizando em grupos: ciência popular, ciência militante, ciência informal, ciência colateral. Ele defende uma ciência mais próxima dos cidadãos, amadores, ativistas e hackers, de maneira que a sociedade civil organizada possa alterar os paradigmas da ciência acadêmica, no que ele chama de modernização epistêmica, na luta contra a pretensão universalista da ciência, que ignora diferenças de cultura, gênero, raça, classe e localidade. Num mundo intrincado e interconectado, os problemas não podem ser analisados fora do contexto, pois cada contexto interage e interfere de maneira única, num movimento de rede, envolvendo tanto atores humanos quanto não-humanos².
¹ O CSIC é uma agência do Estado espanhol dedicada ao fomento da investigação científica e tecnológica. É a maior instituição pública dedicada à investigação em Espanha e a terceira da Europa.
² TAR – Teoria ator-rede
Ciência ativista
Na abordagem de ciência por amor, Lafuente chama atenção a grupos decisivos nos espaços do conhecimento, dentre algumas figuras, frequentemente ignoradas nas histórias da ciência, como a população, amadores, ativistas e hackers. Ele cita alguns exemplos como o de grupos de pessoas que promoveram mudanças em empresas que prejudicam cidadãos, como no estado de Minnesota, Estados Unidos, em que um grupo de habitantes formou uma coalisão para protestar contra o excesso de ruído causado pelo tráfego aéreo e conseguiram alterar a dinâmica de tráfego na região afetada.
Um outro caso foi de plantações de milho transgênico que acabou interagindo com milhos nativos no México, causando uma grande preocupação, pois aquele país tem no milho um elemento cultural muito forte e tradicional. A ONG Sin Maíz No Hay País tem liderado esse movimento em defesa da cultura mexicana. “O ato jurídico é o resultado de uma ação de coletiva de cidadãos, agricultores, camponeses, populações indígenas, advogados, cientistas e ativistas que lutaram para defender a cultura mais representativa do México – o milho – da agressão das culturas transgênicas das corporações, que estão se impondo no mercado internacional.”.
Outro belo exemplo do poder das ciências cidadãs é o movimento software livre, surgida da cultura hacker. A filosofia por trás do software livre inclui rejeitar softwares proprietários, desenvolvidos por grandes corporações, que disponibilizam comercialmente seus produtos, o que invariavelmente reduz a acessibilidade da tecnologia aos mais vulneráveis economicamente.
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**Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do ENB.