*Coluna por Aletéia Lopes, 25/04/2022
Os conflitos geralmente acabam se agravando ainda mais após a morte do fundador. Quando o fundador está ativo, mesmo frequentando a empresa de forma esporádica, sua presença por si só consegue intimidar o surgimento de questões ocultas, mágoas não ditas, que não vêm à tona em respeito a sua presença.
Muitos herdeiros pensam: “O nosso pai está presente, ele está vivo, então não vamos falar disso, porque ele pode se aborrecer. Mesmo que ele tenha saído da função, deixado a cadeira de presidente, ele continua sendo o nosso pai, o fundador da empresa e da família, o patriarca”.
Alguns fundadores até passam a empresa para o nome dos filhos, no entanto alguns possuem uma postura tão “coronel” que os filhos não decidiam absolutamente nada, porque essa transferência estava só no papel.
Fato é que todos os filhos viviam em um contexto no qual o pai escolheu tudo o que eles tinham até o momento. Desde a cor do carro até o local onde cada um deles iria morar depois que saíssem da casa da família. Ninguém tinha coragem de tomar uma decisão na empresa sem consultar o fundador, porque ele tinha o poder de patriarca.
Esse é apenas um dos motivos que me levam a dizer que os desafios e conflitos entre os herdeiros se potencializam com a morte do fundador, porque a partir deste falecimento, a figura que impunha “respeito” e “paz” e que ainda pairava sobre o ambiente corporativo e familiar desaparece completamente.
Se a família não tiver estabelecido uma sucessão organizada, com regras claras; com um acordo de sócios bem definido; se não tiver uma sucessão patrimonial já realizada, grandes conflitos familiares ficam eminentes. O problema é que todos os problemas residuais virão à tona de uma só vez e inevitavelmente podem ocorrer brigas com consequências graves.
É por isso que surgem muitos conflitos em empresas familiares quando o fundador morre. Isso ocorre pela não existência da governança, que separa os ambientes jurídico, familiar e corporativo. Quem representava este elo era o fundador e quando ele morre, o elo se rompe e a governança da família acaba sendo extremamente necessária para se chegar a um acordo, porque surgem aspectos subjetivos e mal resolvidos.
Ninguém é imortal, por mais duro que seja aceitar isso. Os heróis e heroínas de verdade não usam capa ou têm poderes sobrenaturais. Eles são homens e mulheres que de fato fazem um esforço sobre-humano para conseguir erguer uma empresa com muito esforço e manter suas famílias com bases sólidas, valores que não se negociam. Porém, até mesmo estes homens e mulheres de fibra precisam reconhecer que algum dia eles podem partir – seja por falecimento ou simplesmente uma aposentadoria – e, nesses momentos difíceis, são justamente o planejamento e a organização preventiva que se tornam grandes fontes de alívio para que a família consiga elaborar o luto e tomar decisões sensatas.
*Aletéia Lopes é escritora e diretora da HerdArs com experiência em projetos de governança para Famílias Empresárias e formação de Herdeiros/Sucessores. Mentora estratégica de executivos familiares e mediadora de conflitos. Graduada em Serviço Social, com formação em Mentoring, Coaching, Constelação Sistêmica e Terapia Familiar. Membro do Instituto Brasileiro de Governança corporativa – IBGC/CE. Diretora de Governança da Câmara de Comércio e Indústria Brasil e Alemanha no Ceará – CCIBAC.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do ENB.