A indústria farmacêutica no Brasil é conhecida por seu generoso financiamento de viagens, jantares e presentes para médicos, prática que suscita preocupações sobre potenciais conflitos de interesse. Um levantamento feito pelo UOL mostrou que, apenas em Minas Gerais, foram gastos cerca de R$ 200 milhões em seis anos com essas atividades.
A lei estadual de Minas Gerais, única no país, exige que tais gastos sejam declarados, embora a falta de fiscalização deixe muitas transações no escuro. De acordo com a investigação, a maior parte dos recursos foi destinada a um pequeno grupo de médicos, com 70% dos valores concentrados em apenas 3% dos profissionais.
A fabricante de produtos estéticos Galderma destacou-se ao gastar quase R$ 1 milhão para levar 21 médicos a um evento em Nova York, evidenciando a ligação entre o volume de prescrições e os convites para eventos exclusivos. O ortopedista Cristiano Menezes, por exemplo, recebeu R$ 2,7 milhões em benefícios da empresa de instrumentos cirúrgicos NuVasive, ressaltando a prática comum de médicos operarem exclusivamente com produtos de empresas específicas.
O setor defende esses investimentos como forma de capacitação, enquanto críticos apontam para a influência indesejada nas decisões médicas. A falta de transparência e regulamentação adequada a nível nacional perpetua o problema, com iniciativas como o Sunshine Act americano, que busca regular essa prática, ainda longe de ser uma realidade no Brasil.
A análise dos dados revelou que o financiamento não se limita a eventos educacionais, mas estende-se a jantares em restaurantes de luxo e presentes variados para consultórios. Os gastos com transportes e hospedagens lideraram as despesas, seguidos pela contratação de palestras. Grandes nomes da indústria farmacêutica, como AstraZeneca, Pfizer e Janssen, foram alguns dos que mais investiram nesses encontros, que frequentemente incluem apresentações de produtos antes das refeições.
Além disso, a investigação descobriu o financiamento de itens pessoais e para consultórios, como cadeiras, notebooks e até ar-condicionado, sugerindo uma tentativa de influenciar diretamente os profissionais de saúde.
O Ministério da Saúde, sob diferentes administrações, tem se mostrado reticente em abordar a questão, deixando a responsabilidade por uma maior transparência e regulamentação em aberto. Enquanto isso, a prática continua a florescer, com pouca visibilidade pública ou supervisão regulatória, destacando a complexa relação entre a indústria da saúde e os médicos no Brasil.